Cresci com a Internet. Nasci em 1990 e na mesma década era quase um luxo ter um computador. Antes do Windows 95 e das interfaces amigáveis talvez nem fizesse grande sentido. Foi nessa altura, quando era pequenina, que comecei a nutrir interesse pela infinitude de possibilidades que a torre ligada à ficha trazia para o mundo. Sou do tempo em que existiam plataformas como o Casquides (a Internet dos kids, ah! Quem se lembra?) e o gerador de sites do Terravista. Aproveitava todas as oportunidades para explorar estes recursos nos computadores dos meus tios.
Só em 2003 é que tive direito a um computador como deve ser e Internet em casa. Tivemos dissabores e discussões por causa do consumo de dados para lá do plafond, que era excedido sucessivamente graças aos downloads de música, mas não só. Os anos 2000 trouxeram-nos a democratização e expansão das redes sociais que, creio, numa primeira fase dependeram muito dos blogs. Tanto quanto me lembro, a maioria dos que tínhamos em Portugal estavam alojados no Blogger ou no Sapo. Passei por ambas as casas, há mais de 20 anos que tenho blogs. Este que estão a ler vai a caminho dos 16, já em Outubro. Acompanhei, portanto, os primórdios, o auge (será?) e o declínio (será, que sim?) dos blogs.
Fiz o meu primeiro blog no Blogger, no fim de 2003.
Sou do tempo em que a blogosfera era uma espécie de aldeia onde todos se conheciam. Acompanhei os primeiros jantares e encontros de blogs. Foram sendo criados nichos e categorias e as coisas, de certo modo, foram-se organizando. Não tanto quanto noutros países mas, ainda assim, encontrámos ordem. Foram surgindo os entendidos que nos diziam que deveríamos produzir os conteúdos de uma determinada maneira, e não de outra. Tornou-se algo difícil manter a espontaneidade e a cadência. Desenvolveram-se as redes sociais e passámos a preferir conteúdos de consumo imediato, rápido, efémero. Passámos a ter preguiça de ler – e de escrever, consequentemente. Passámos a remoer mil vezes antes de produzir ou publicar um texto porque, será que alguém quer saber? Passámos a pensar tanto no storytelling e no SEO que, de repente, veio a desmotivação. Antes, era aceitável o feito. Começámos a adiá-lo por querer que fosse perfeito.
Enquanto leitora, sempre gostei muito dos textos corridos, qual livro, qual revista da vida das pessoas, que se publicavam nos blogs. Muitas vezes, sem critério – hoje desabafamos sobre o trabalho, sobre a faculdade, amanhã falaremos sobre as últimas compras de beleza, no dia a seguir temos uma receita do bolo da mãe. Estes registos deixaram, praticamente, de existir em plataformas próprias. Enquanto consumidora, gosto muito de pesquisar sobre determinados temas e produtos antes de ponderar uma compra. Há uns anos, era fácil encontrar a informação porque havia quem escrevesse sobre o tema e os conteúdos eram rapidamente agregados aos motores de busca. A menos que um determinado produto viralize, já repararam em como está complicado encontrarmos informação objetiva sobre um determinado produto ou tema? Não há hashtag que substitua a comodidade de pegar em duas ou três palavras, pespegá-las no Google e encontrar mesmo o que pretendemos.
Perdemos autoridade sobre a nossa palavra.
O pior é pensar que toda a gente passou a publicar em plataformas terceirizadas sem qualquer possibilidade de backup, recuperação ou localização caso haja alguma anomalia ou, simplesmente, os proprietários das mesmas decidirem bloquear os acessos (o que não é assim tão improvável, vejam o que está a acontecer com o Twitter/X no Brasil, por exemplo). Como bem devem saber, há muita gente que está a confiar a viabilidade dos seus negócios na totalidade à boa fé do funcionamento das redes sociais.
Em 2024, creio que estamos a olhar para trás, a refletir e a pensar que talvez tenhamos dispersado de mais. O melhor tempo para viver é agora, mas podemos sempre manter o que é bom e que funciona connosco. Serei a única a ter saudades dos primórdios dos blogs? Do Tumblr, até. Tenho saudades dos conteúdos espontâneos, feitos em 5/10 minutos por dia, com a vontade e os recursos de que dispomos, sem querer mais floreados. Das pequenas comunidades que se criavam em caixinhas de comentários. Da felicidade conjunta por pequenas descobertas e conquistas.
Vou tentar pensar menos no planeamento e mais na execução, porque sempre gostei mais da partilha dos bocadinhos do que em ter um catálogo para vos apresentar. Não sei se gosto de vos apresentar uma página aos quadradinhos, tipo caderneta de cromos, mas até os ecrãs mudaram – ficaram mais pequenos, verticais, pouco amigos de páginas que se desenrolam tipo pergaminho. Definitivamente, os blogs eram melhores em 2004. E em 2014. Eu acredito que ainda vão voltar em grande força. Por aqui continuo, sejam quais forem as vontades das massas.